O ano de 2017 foi daqueles marcantes que veio para mudar toda a mobília de lugar. Logo em seus primeiros momentos, já estava diferente do script habitual, pois despontou no horizonte disposto a mostrar às pessoas – aquelas sentadas na sala de jantar cuja ocupação é centrada em apenas nascer e morrer – que estavam na hora de olhar além da janela da sala.

Pediu para organizar o quartinho de despejo, aquele famoso cômodo que todo mundo evita. Exigiu que abríssemos espaço para as coisas novas que ainda nem sonhávamos. Incumbiu-nos desapegar dos extratos bancários dos anos anteriores, das caixas esquecidas repletas de destroços de recordar, revisitar lugares percorridos pelos sapatos poídos, dar mais uma chance para aquela blusinha tão anos 2000, comprar um celular, não carregar mais pedras, ir ao dentista, mandar embora tudo aquilo que não fazia mais sentido, seja lá de qual material ou essência de sua composição – e o principal, escrever um final para o capítulo de uma história.

Aviso de antemão que não foi fácil. Mexer no que se ignorava há tanto tempo, transformou-se em um processo doloroso o qual escancarava toda a sujeira depositada debaixo do tapete. Era tanta poeira que foi inevitável não perceber o quanto relapsos fomos. Quantas coisas não tivemos zelo, quantas pendências esquecidas no canto. Meu Deus, quantas vezes deixamos a comida estragar na geladeira ou quantas plantas já morreram por falta de aguar. Encarar o que havia debaixo do tapete era como nos enxergar em cada detalhe imperfeito. Isso despertou medo.
Sim, tivemos medo. Contudo o maior dos medo era no que poderia vir depois que nos livrássemos dos restos mortais esquecidos no despejo. Afinal, haveria um espaço nunca pensado antes para novas possibilidades. Bateu um arrepio na nuca e uma vontade louca de nunca mais sair da cama. Brigamos no quarto escuro com receio de toda sombra que aparecesse.

E os dias passaram como a chuva de meteoros que nunca conseguimos ver porque as luzes da cidade queriam brilhar mais que os corpos celestes. Um por um, caindo que nem as folhas das árvores, até chegar no limite. E, 2017, já cansado da protelação e burocracia, levantou-se, deu um soco na mesa e disse: – Já chega, vocês mudarão por bem ou por mal. Daí, encolhemos mais ainda dentro de nós mesmo, afim que pudéssemos nos passar batido. Pensávamos que uma hora 2017 iria sem cansar e parar de ladrar por detrás da porta. Vamos, enfim, poder levar a vida da mesma forma antiquada que sempre tivemos. Não foi bem assim.
E foi por bem, porque as mudanças nunca chegam por mal. Por mais que 2017 tenha sido duro conosco, sempre falava docemente com uma xícara de café quente nas mãos. E sabia que ser firme, foi necessário para podermos planejar e consertar tudo que estava quebrado, partido, estilhaçado ou quebrar, partir e estilhaçar de uma vez por todas. Foi tudo intenso. Foi no vai ou racha, para ver no que ia acontecer, apostar mais uma vez.

E quando resolvemos limpar a bagunça, arregaçamos as mangas e trabalhamos. Empenhamo-nos como nunca tínhamos feito, suamos a camisa, tivemos calos nas mãos, dormíamos exaustos pensando que tudo se repetiria da mesma maneira no outro dia. Choramos. Claro que tudo ficou pior até percebermos que não era necessário sofrer. Não precisa se descabelar para contemplar uma vida abundante.
Apenas continuamos varrendo o quintal, limpamos a calha, arrumamos a goteira do telhado. Até que um dia, vimos que o carteiro deixou uma encomenda. Deve ter sido 2017, certamente. Estávamos acostumados com tanta privação que tínhamos receio de abrir o pacote.
Respiramos fundo e vimos o que tinha ali, novas oportunidades ainda pequenas. Minúsculas, mas, para cada um de nós, era tudo que precisávamos.

Agora, sentamos na sala de jantar e olhamos por através da janela, com gratidão e esperança, esperando não viver apenas para nascer e morrer.

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